sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Doing good and doing well

Ficou patente em Davos, que os líderes das grandes empresas estão preocupados com a perda de confiança no capitalismo, razão pela qual, muitos deles têm, de alguma forma, a palavra confiança nas suas agendas. Nas encostas da estância de esqui suíça, embalados pela elite corporativa e seus clubes de fans, era difícil discernir uma crise no capitalismo. No entanto, um olhar para o vale em baixo e para o resto da Europa, mostra que as provas desta crise são abundantes.

Com surgimento de partidos fora do centro, dos socialistas em Portugal ao Syriza na Grécia, ao crescimento dos nacionalistas em França, o Establishment está ameaçado. Os Socialistas querem nacionalizar algumas empresas, como é o caso da TAP, os nacionalistas querem fechar as fronteiras. Há uma desconfiança crescente com relação aos negócios e à forma como são conduzidos. No Reino Unido, é Jeremy Corbyn. Em Espanha, o Podemos. Mesmo os EUA têm a ameaça desestabilizadora de Donald Trump.

A causa raiz pode ser encontrada na crise financeira e no movimento Occupy que se seguiu, com os seus ideais anti-establishment. As grandes companhias eram más, bem como o seu modo de operar, desde os banqueiros que derrubaram o mundo, aos gigantes da tecnologia que evitavam  impostos com pouca ou nenhuma consequência pessoal para os envolvidos. Os produtores de alimentos que mentiram sobre a presença de carne de cavalo nos seus produtos e os fabricantes de automóveis a vigarizarem os testes de emissões.

Os agentes económicos sabem que os dias das companhias free-for-all acabaram, e que o livre mercado não é mais uma virtude em si mesma. A  actividade privada tem hoje, ao mesmo tempo, uma enorme participação na sociedade bem como uma enorme influência sobre ela. Os comboios, os media bem como as empresas de utilidades (electricidade, água, gás) costumavam ser no passado instituições públicas. Agora são, na sua maior parte, regidas pelo lucro, o que muitas vezes põe a condução do negócio contra as necessidades dos seus clientes.

No Fórum Económico Mundial, em Davos, emergiu um novo contrato social. “Doing good and doing well”, foi como o colocou Bob Diamond, ex-chefe do Barclays, mais conhecido por fazer muito bem a si mesmo. Bob Diamond está a trazer a moderna finança para África, aumentando a inclusão financeira e o emprego, gerando ao mesmo tempo lucro.

David Sable, presidente-executivo da Y & R, uma empresa de marketing que opera à escala global, disse que a geração millenial - aqueles que nasceram depois 1982 - estava a mudar a forma de fazer negócios. Quase dois terços daquele universo, inquiridos pela Deloitte, valorizam o "propósito" sobre o lucro. Eles estão socialmente envolvidos, e sem cinismo, sabem que as empresas têm que ter lucro, mas pondo um preço na ética. Por outras palavras, as empresas voltadas para o consumidor, devem fazer o bem a fazer bem.

Lançar dinheiro em causas nobres já não é suficiente. Num evento para celebrar uma parceria de dez anos entre Pampers e a UNICEF, onde, por cada  pacote de fraldas vendidas, se conseguia  a verba necessária para a compra de uma vacina do tétano destinada os países em vias de desenvolvimento, um jovem convidado disse que esta iniciativa não podia ser levada a sério, a menos que a ética percorresse o DNA corporativo da Procter & Gamble..

As empresas estão estão cada vez mais a adoptar o: “Doing good and doing well”. Trinta e seis grandes empresas, incluindo Nike, Walmart, Unilever, Goldman Sachs, Starbucks e P & G, comprometeram-se num programa de carbono neutro. Muitos delas gerem já fundações de caridade ou acções como a da P & G com a Unicef, mas reconhecem que a ética na condução dos seus negócios se sobrepõe às iniciativas filantrópicas e à eventual gestão “imoral” dos seus negócios. 

A Virgin Atlantic está a cooperar com uma companhia chamada Lanza Tech, que utiliza a biotecnologia para converter carvão dos resíduos em combustível. O HSBC está a financiar títulos verdes (Green Bonds) para projectos que geram benefícios ambientais e/ou climáticos positivos. KPMG  insiste para que todos os fornecedores devem pagar um salário justo. David Sable disse que a responsabilidade social não é mais uma lista de caixinhas quadradas que é necessário preencher, mas que é essencial para a rentabilidade. Os agentes económicos estão dando a volta para lá chegarem. Haverá sempre maçãs podres como a Sports Direct, com as suas pobres práticas de trabalho, as emissões da  Volkswagen’ com um "dispositivo manipulador" ou sonegação de impostos da Google (a negociação com JC Junker para pagar menos impostos no Luxemburgo). Mas a maior parte das grandes empresas reconhece que deve abraçar a causa da ética, se quer restaurar a confiança no capitalismo, acabar com os extremistas políticos e conquistar esses millennials exigentes. É no seu próprio interesse, afinal.

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