sábado, 9 de maio de 2015

Carvão - O paradoxo alemão

Enquanto a Alemanha gosta de desempenhar o papel do bom aluno da ecologia responsável, a decisão de Angela Merkel de abandonar o nuclear, deu um novo élan a uma das fontes de energia mais poluente: O carvão.


Uma enorme coluna de fumo branco é vista a vários quilómetros de distância. A central eléctrica de Boxberg, no Saxe, a dois passos da fronteira polaca, é um verdadeiro  pesadelo de ecologista.

Cada dia, as suas cinco caldeiras com uma altura de 150 metros, queimam 63 000 toneladas de carvão. Apesar dos filtros, em 24 horas, cerca de 1 000 toneladas de fuligem saem pelas chaminés para as florestas vizinhas.

Anualmente, cerca de 20 milhões de toneladas de dióxido de carbono são emitidas por esta central que fornece energia eléctrica a seis milhões de lares, e cuja área ocupada é semelhante à do Mónaco.

Desde a queda do muro de Berlim, que se assiste um aumento significativo da queima de lenhite - um dos tipos de carvão existentes que apresenta na sua constituição um elevado teor de carbono, cerca de 70%, e uma vez que a lenhite sofreu uma pressão menor, encontra-se à superfície o que torna a sua extração mais fácil e com menores custos associados - que chega à central após atravessar um tapete rolante que parte da mina a céu aberto de Nochten, situada a 2,5 km de distância.


Este depósito de carvão de 78 km2, é explorado desde 1968. Todas as máquinas que escavam o solo 24 horas por dia, datam do tempo da República Democrática Alemã (RDA). Na maior escavadora, que devora 12 000m3 de terra por hora, ainda se pode ver o nome do seu fabricante: Fábrica Georgi Dimitrov - assim designada em homenagem ao dirigente comunista búlgaro - instalada em Magdburgo a 155 km de Berlin. A ponte rolante sobre carris de 625 metros de comprimento é a maior estrutura industrial móvel ainda em actividade.


No ano passado a queima desta rocha altamente poluente permitiu produzir 43% da electricidade alemã, valor longe da obtida pelas energias renováveis (26%). O nuclear teve um peso de 16%.

Se um começo de inverno ameno permitiu, no ano passado, uma redução do valor das emissões de dióxido de carbono na atmosfera, estas últimas não pararam de crescer nos últimos cinco anos, atingindo 951 milhões de toneladas em 2013 contra 913 em 2009. 

Em 2013 as emissões de gaz carbónico da Alemanha aumentaram 2% face ao ano anterior, enquanto na EU caíram 2,5%.

O sismo que provocou o acidente na central de Fukushima, teve grande impacto na Alemanha. Para surpresa geral, Angela Merkel decretou a paragem dos oito reactores nucleares mais antigos e o fecho  de mais nove até 2022. 

Para lutar contra o designado aquecimento global, Berlim quiz dar o exemplo ao resto do mundo.  O seu objectivo é de obter 80% da electricidade a partir de energias renováveis até 2050.

Posta em prática em 2000, a lei sobre as energias renováveis (EEG) que garante aos produtores de energia eléctrica "verde" uma tarifa de compra superior ao da eletricidade convencional, veio a tornar-se um verdadeiro buraco financeiro. 

Atraídos pelos preços garantidos elevados, centenas de milhares de lares equiparam-se de painéis solares. No ano passado o estado Alemão pagou a bagatela de 24 biliões de euros em subsídios aos produtores de energias renováveis.

Este programa já custou 300 biliões de euros, e estima-se, se nada for feito, que atinja os 680 biliões de euros em 2022. 

Os subsídios são pagos pelos utilizadores que pagam in fine através de taxas que lhes são impostas nas suas facturas. Assim, o budget de electricidade nos lares alemães mais que duplicou, em pouco mais de uma década, já que o kWh passou de 0,14 euros em 2000 para o valor actual de 0,29 euros. Também em consequência deste programa, 52% do valor da factura de eletricidade paga pelos particulares, corresponde a taxas e apoios às energias renováveis, o que também sucede em Portugal, só que por cá pode atingir os 56%.

Para fazer face a esta situação Berlim reduziu drasticamente os apoios acordados aos particulares e empresas, destinados à instalação de painéis solares.  Hoje um proprietário que invista numa instalação recebe menos 0,13 euros por kWh contra 0,40 há pouco tempo atrás. Entretanto o estado alemão anunciou que não dará mais ajudas quando a capacidade instalada atingir os 55 GWh, o que deverá acontecer a partir de 2018. Dois factores que que condenaram ao desaparecimento dos produtores alemães de células fotovoltaicas.

Centrais que vomitam, como nunca, os seus fumos nocivos, especialistas em energias renováveis sem dinheiro... A transição energética alemã está longe de ser simples. Difícil, neste caso, de dar lições de ecologia, sobretudo, aos seus parceiros europeus...

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