Uma coisa é o Estado e outra o Povo/Nação, como bem se sabe. O Estado, como hoje o entendemos, é um fenómeno historicamente recente, saído da mente dos ideólogos iluministas da revolução francesa, se bem que as suas raízes já se possam encontrar em Maquiavel, por exemplo.
Face à integração em curso e à actual tendência globalizante, o ciclo de vida do Estado jacobino entrou claramente na sua fase final, sobretudo na Europa, onde nasceu. Se o seu poder parece mais forte do que nunca, atropelando tudo e todos, mais não é que o estridente e agonizante canto do cisne.
Este fenómeno irrecusável anuncia graves dificuldades para as repúblicas, que verdadeiramente só no Estado se consubstanciam. Pelo contrário, abre enormes potencialidades ao ressurgimento das monarquias, que não são minimamente dependentes do Estado. Aliás, mesmo as actuais monarquias europeias vão beneficiar muito desse definhamento do Estado, que coarcta muitas das suas virtualidades.
Na verdade, a Monarquia não se distingue da República por propor uma diferente forma de chefia do Estado. A Monarquia é a forma particular como um Povo/Nação se organiza numa comunidade viável e solidária. O rei não governa nem chefia o Estado, mesmo quando em situações histórias extremas a isso se viu obrigado. A Família Real é, isso sim, a mais perfeita representação do seu Povo: quer a memória dos que já passaram, quer o do presente, quer os direitos e a esperança dos que hão-de vir. Os Povos/Nações podem encontrar várias formas de se auto-governar, como já fizeram no passado. A Monarquia é sobretudo o garante da unidade orgânica e identidade do seu Povo/Nação.
A Monarquia não permite, contudo, uma forma qualquer de organização social, porque não cabe nela, por exemplo, a tirania. A Monarquia, para o ser efectivamente, é uma forma especial de organização social, que se caracteriza e define pelos métodos que usa e não pelos fins que pretende atingir, na convicção de que se os meios forem bons, os fins não hão-de ser maus. Em boa verdade, a ciência política sabe já que não é possível à mente humana prever todas as consequências, e as consequências das consequências, que uma alteração social vai suscitar. Um objectivo, portanto um fim a atingir, transforma-se sempre numa causa que vai provocar outros fins, num processo infindável e verdadeiramente incontrolável. É esse o grande pecado social do pensamento republicano e iluminista: julgar que pode controlar o resultado final das mudanças voluntariosas, e que maus meios podem conduzir a bons fins. Portanto, se a ideia de tradicionalismo se pode associar à Monarquia, não é por atavismo ou reaccionarismo ininteligível. É por sabedoria.
De alguma forma, a Monarquia é o anti-maquiavelismo; porque é o regime dos Princípios e das boas práticas, secularmente testadas.
Assim, e para melhor consubstanciar o que ficou aflorado, é-nos possível enunciar aqueles que são os 9 grandes Princípios monárquicos, num manifesto claro e de unidade, que permita a todos saber, na diversidade que tanto prezamos, onde estamos e o que queremos.
O rei é livre e livres somos nós. Parece simples ser-se livre, mas não é.
O anseio pelas liberdades é cultural. Por isso, a natureza humana, imutável como é, paradoxalmente aspira à liberdade e por regra constrói as redes que peiam essa mesma liberdade! A Monarquia foi o processo, apurado ao longo de milénios, não só para garantir as liberdades mas também para promover activamente o seu desenvolvimento e enraizamento.
A República, que em nome da liberdade abstracta tantas vezes coarctou as liberdades concretas (basta pensar na revolução francesa!), afinal não é mais que um subproduto desastrado e mal pensado da aspiração à liberdade que a Monarquia diligentemente promoveu ao longo dos séculos, mesmo quando, à luz de uma desinformada mentalidade hodierna, assim pode não parecer.
Hoje, um século volvido sobre o terrorismo que acabou com a Monarquia portuguesa, as liberdades estão verdadeiramente em perigo! O Estado todo-poderoso e omnipresente tudo quer controlar e normalizar. Sentimo-lo todos, quotidianamente, nas pequenas e nas grandes coisas, num ciclo vicioso incapaz, pela sua natureza, de se auto-regenerar. Por isso a defesa das liberdades é talvez a principal e mais urgente batalha da Monarquia, ciente de que só ela, na verdade, as pode garantir e promover.
Sem as liberdades não pode haver diversidade. A República é, por natureza e ideologia, um regime que aspira à unicidade e só nela verdadeiramente se realiza. E aqui é preciso distinguir as repúblicas modernas, saídas da revolução francesa, das republicas aristocráticas da Antiguidade ou da Idade Média, que não têm nada a ver entre si.
Pelo contrário, a Monarquia é por natureza a harmoniosa congregação do diverso e só com ela a diversidade ganha cidadania. Que o diga Espanha! A diversidade é vida, a unicidade é morte.
As potencialidades criadoras e inovadoras que a diversidade suscita e desenvolve é o que tem faltado a Portugal, uniformizado à força pela filosofia republicana. E desenganem-se: não há unicidade boa, mesmo que seja aquela que melhor se coaduna com as nossas particulares ideias. A unicidade é sempre má, porque estiola e porque são inadmissíveis os meios que usa para o conseguir. Pelo contrário, a diversidade é natural e rica como a vida e permite que todos e cada um se realizem em liberdade e alegria. E só aparentemente, numa visão de curto prazo, a diversidade pode ser difícil de gerir. O conflito não está aí, mas sim na prepotência unificadora do Estado republicano.
A República não sabe lidar com a diversidade. A Monarquia nasceu dela, vive dela e só nela verdadeiramente se realiza. Com a Monarquia, pela sua própria natureza, a diversidade é uma garantia.
A Monarquia é, sobretudo, uma federação de comunidades livres. Como uma grande família, unida no essencial mas diversa nas suas idiossincrasias. Por isso as células-base da Monarquia são as famílias, mais do que os indivíduos. O Homem é por natureza um ser gregário e só neste âmbito verdadeiramente se realiza. O individualismo desenfreado que a República propõe e fomenta é um beco sem saída, que só aparentemente pode conduzir à felicidade e que, na verdade, conduziu a nefastos fenómenos tipicamente republicanos, como são os conflitos geracionais.
Devolver o máximo possível de soberania às famílias é assim um princípio fundamental da Monarquia, que se deve estender a todos os sectores, a começar logo pela questão fulcral da educação dos nossos filhos. O Estado existe para nos servir e não para nos obrigar a fazer o que ele acha melhor, despindo as famílias de toda a sua natural soberania. É às famílias que compete decidir como querem viver e como devem ser educados os seus filhos, obedecendo apenas, é claro, a um mínimo consensual de princípios inalienáveis. E cabe às famílias organizarem-se, de baixo para cima, nas comunidades que bem entenderem, com todas as liberdades, desde que estas não contendam com as liberdades dos outros. E só em Monarquia esta estrutura modular da sociedade pode florescer em harmonia, porque é da própria natureza monárquica e porque só ela é suficientemente forte e orgânica para equilibrar devidamente este instável e delicado fervilhar da vida livremente vivida. Até porque, e isso é vital, só no interior das comunidades naturais, autênticas, a solidariedade social é espontânea e resulta inegável e imperiosa como no seio de uma família.
Princípio da subsidiariedade
Muito se apregoa hoje o justo princípio da subsidiariedade, que basicamente consiste em nunca decidir a um nível superior aquilo que pode ser decidido a um nível mais baixo.
No tempo histórico, a Monarquia portuguesa seguiu sempre este princípio não formulado. Promotora do municipalismo e das suas liberdades e responsabilidades (porque não há liberdades sem responsabilidade!), a Monarquia histórica, bem analisada a mentalidade coeva, deixou verdadeiramente o país respirar e tomar organicamente conta de si mesmo, de forma adulta e livre.
Hoje, os desafios são outros. As verdadeiras comunidades, indispensáveis à sã convivência e à solidariedade social, constroem-se com a liberdade de decidir a esse nível tudo o que aí pode ser decidido, portanto na aplicação do princípio da subsidiariedade. Uma comunidade amputada desta capacidade rapidamente se desagrega. Apesar de o enunciar como desejável, a República tem a máxima dificuldade em aplicar este princípio, com receio de perder o controlo, sobretudo estabelecido na pirâmide centralista que está na sua essência política.
Já a Monarquia, muito mais do que nas grandes super-estruturas sufragadas de tantos em tantos anos por voto universal, assenta na descentralização e na democracia participada e permanente, aliás o seu nível mais autêntico e profícuo.
O edifício legislativo português é hoje um amontoado contraditório e lacunoso de ditames, e nunca o Direito esteve tão afastado da Justiça. Ninguém hoje sabe sobre demasiadas coisas o que é certo ou o que é errado. A mesmíssima questão pode ter sentenças diametralmente opostas. E, pior, muitos anos depois!
A ânsia controladora do Estado republicano, apoiada na dependência que dele conseguiu forjar na sociedade, elaborou um monstro legislativo sem pés nem cabeça, qual harpia enraivecida e demente, em constantes convulsões, que regula tudo menos a Justiça.
Convém aqui deixar claro que a questão não se coloca nem na divisão dos poderes nem ao nível do Poder Judicial, mas no emaranhado legal com que se vê obrigado a lidar. Se bem que esse monstro legal também influa, e muito, na forma ineficaz como funcionam os tribunais e na demasiado frequente impreparação dos juízes.
Como bem prova a História, a Monarquia não tem, por natureza, a vocação do controlo legislativo, e sabe que o legislador, se tudo quiser controlar, andará sempre atrasado e desfasado em relação à vida real.
É pois natural que seja uma das bandeiras da Monarquia a verdadeira Justiça, assente num conjunto mínimo de leis, absolutamente unívocas, de forma que todos possam saber à partida com o que contar, e suficientemente gerais para garantirem a todo o momento os princípios aplicáveis. Toda a restante conflitualidade social deve ser dirimida com base sobretudo nesses princípios e não em leis burocráticas ou pormenores tecnicistas. A Justiça é que deve enformar o Direito, não o contrário.
O que nos remete directamente para outra questão fulcral da mundividência monárquica: a dimensão ética que a vida em sociedade (e portanto o regime) não pode dispensar.
A Monarquia é sobretudo um regime ético, que se rege por valores.
Mas desenganem-se todos os que pensam que a Monarquia moderna pode ser um regime confessional ou imiscuir-se nas liberdades de cada um, sobretudo na liberdade religiosa ou de expressão. Pelo contrário, a Ética monárquica não lhe permite perseguir ou limitar alguém pelas suas convicções, como a República fez com a Igreja, num exemplo entre muitos. Nem tem credo oficial. O que não impede, é claro, que o rei tenha e manifeste a sua fé, como qualquer um.
Os valores monárquicos são de outra ordem e congregam-se sobretudo nas liberdades com responsabilidade, no respeito pelo património cultural e natural, e na garantia de que os legítimos interesses da economia capitalista e consumista não se imponham, sem freio, sobre uma sociedade massificada e alienada. E fá-lo não de uma forma paternalista, à republicana, mas promovendo e garantido uma sociedade diversa e adulta, capaz de fazer opções. Ao devolver a soberania às famílias e às suas comunidades, a Monarquia dota-as organicamente de mecanismos de defesa eficaz contra as centrais de intoxicação pública.
E não se pode, em boa verdade, conduzir um novo processo civilizacional sem a formação de verdadeiras elites, capazes de, pelo exemplo e pela palavra, liderarem a mudança. Ora, também aqui a Monarquia se distingue, por saber essa necessidade e poder enquadrar adequadamente a formação dessas vanguardas.
A elite é obviamente formada pelos melhores, nas várias áreas do Pensamento, da Arte, da Ciência, da Cultura, da Educação e das actividades funcionais e económicas. São dados objectivos, mensuráveis até, que nada têm a ver com a substância da sua liderança. O que a Monarquia quer não é definir um tipo de elite, nem tão-pouco limitar-se a restaurar as elites tradicionais, mas sim garantir a formação de verdadeiras elites. Assim como, e isso é vital, dar-lhes a devida visibilidade pública, pois só assim podem ser socialmente eficazes.
Há que ter a coragem de dizer que democracia não é a tirania dos estúpidos, dos ignorantes, dos mal-educados, dos sem-carácter e dos burocratas. E que só a promoção e desenvolvimento de verdadeiras elites, livres e diversas, reconhecidas como tal, nos pode livrar das falsas elites republicanas do jet-set, dos media, da política e dos partidos, e evitar a total inversão de valores que cada vez mais caracteriza a decadente sociedade ocidental.
Não é por acaso que o Povo português é cada vez mais inculto. Não só por aquilo que não aprende ou lhe ensinam mal, mas sobretudo pela forma como desordena o seu território, como despreza o seu património cultural e natural, enfim, pela forma como está na vida.
A Cultura, na sua acepção mais verdadeira, embora não pacífica, remete para a vivência do conjunto dos conhecimentos e comportamentos civilizacionais. Ao contrário do que querem os republicanos em geral, e os marxistas em particular, a Cultura não remete para o indivíduo mas sim para as sociedades, entendidas como conjuntos orgânicos de famílias e comunidades. Cultura não é apenas a soma de conhecimentos, mas sobretudo a vivência autêntica das pessoas em sociedade e no seu tempo; a forma de estarem na vida. Por isso as culturas são nacionais e até regionais.
As três revoluções que Portugal sofreu num curto espaço de tempo histórico (a liberal, a republicana e o 25 de Abril), independentemente dos seus eventuais méritos, conduziram a uma tripla decapitação da sociedade, com todas as consequências nefastas que isso comportou para o nível e refinamento cultural do Povo português.
Por isso a massificação e a globalização tão facilmente estão a destruir as indefesas culturas portuguesas, não tanto pelo fácil acesso à informação e ao mundo, mas sim pela ideia, incutida por todas essas revoluções, sobretudo pelo republicanos e pré-republicanos, de que as culturas portuguesas são uma coisa menor e atávica, a evitar.
Hoje, as culturas portuguesas estão praticamente reduzidas a fenómenos residuais e por vezes risíveis, do tipo folclórico. Os portugueses como que têm vergonha das suas culturas. E, se nada de substantivo e essencial distingue já as culturas portuguesas das restantes, o futuro próximo será bem pior.
Pelo contrário, a Monarquia emana das culturas nacionais e só nelas verdadeiramente tem razão de existir. Não é por isso difícil perceber que só a Monarquia, sobretudo no actual contexto europeu e globalizante, pode verdadeiramente promover e acarinhar as culturas portuguesas, preservando assim, contra ventos e marés, a nossa identidade enquanto Povo e a nossa qualidade de vida.
Dizem as repúblicas, e nisso foi pioneira a Constituição norte-americana, que o Homem nasceu para ser feliz e procurar a felicidade. Ninguém tem dúvidas de que a felicidade é uma coisa amável e desejável.
A questão não está em querermos ser felizes, atitude assaz saudável, mas sim na obsessão pelo aqui e agora, já!, que domina o actual estado de espírito das sociedades ocidentais. O hedonismo reinante, fruto directo do pensamento republicano e da colonização cultural que os EUA infligiram ao mundo em geral e à Europa em particular, é na verdade um beco sem saída, que muito raramente conduz à felicidade. Sabe-se bem que a satisfação das necessidades é um processo sem fim, pois mal uma necessidade é satisfeita imediatamente surgem outras para satisfazer, num processo infindável e irrealizável. Quem melhor aproveitou a doutrina reinante foram as empresas, promovendo necessidades artificiais que conduziram ao consumismo desenfreado e ao endividamento das famílias, num fenómeno demoníaco que traz tudo menos a qualidade de vida e paz de espírito que podem, de facto, suscitar a felicidade.
A Monarquia tem sobre esta questão uma posição completamente diferente, pois toda a sua estrutura se baseia muito mais na valorização do Ser do que do Ter, no serviço público, na renúncia voluntária e na autodisciplina; numa palavra, na transcendência. Ao promover e premiar a elevação dos espíritos e dos comportamentos, a Monarquia propõe afinal, a cada um de nós, que encontremos a felicidade na procura de uma vida melhor e na honrosa satisfação do serviço prestado e do trabalho bem feito.
A Honra, esse conceito transcendental tão esquecido e desprezado, é uma pedra de toque da mundividência monárquica.
O processo de integração europeia é imparável e irreversível em tempo útil. A Monarquia, ao contrário do que se possa pensar, não é incompatível com este processo, como se comprova nas várias monarquias europeias. Pelo contrário, a Monarquia é o principal garante de que as identidades e culturas nacionais não se dissolvem no conjunto. E só isto é mais do que suficiente para se ser monárquico. Contudo, há uma questão mais funda, que afinal tem a ver com tudo o que ficou dito e que pode ser considerada como o seu corolário, e portanto assume a categoria de um princípio.
A actual civilização europeia, fruto dos desvarios dos séculos XIX e XX, do modelo estatal e da desleal competição mundial, entrou em colapso endógeno e também assistimos hoje ao seu agoniante canto do cisne, incapaz de se defender dos efeitos perniciosos da globalização e do capitalismo selvagem.
Muito tem de mudar para que a Europa reassuma a sua liderança civilizacional. O que, por tudo o que já ficou exposto, só conseguirá pelo ideário monárquico. Assim, dada a interdependência comunitária e o mundo globalizante em que vivemos, não basta que os portugueses tenham uma Monarquia, como às actuais monarquias europeias não bastou o facto de o serem para, de forma eficaz, evitarem a disseminação dos princípios republicanos que minam as respectivas sociedades.
É assim necessário construir e partilhar um movimento internacional que vise o retorno à Monarquia de todos os povos europeus, de forma a revitalizar a Europa como o farol civilizacional que lhe cumpre ser, criando no seu seio um espaço onde as pessoas, as famílias e as comunidades, possam ser, de forma autêntica e livre, o cadinho onde se forja um futuro melhor.